Triangle Strategy Review – Uma pérola para guardar perto do coração

Após deslumbrar o mundo com a série Bravely Default, a equipa da Square Enix liderada por Tomoya Asano voltou a surpreender ao apresentar Octopath Traveler, um jogo que presta homenagem aos JRPGs da década de 90, com um estilo visual atual, mas altamente reminiscente dos trabalhos dessa era. Disposto em explorar mais dessas experiências que nos relembram como seriam esses clássicos se fossem feitos nos dias de hoje, Asano decidiu que estava finalmente na hora do mundo ver um novo Tactical RPG ao estilo de Final Fantasy Tactics e Ogre Tactics, algo especialmente pertinente tendo em conta o sucesso mundial que Fire Emblem conquistou ao longo dos últimos anos. De certa forma, Triangle Strategy é um sonho tornado realidade, um jogo que parece literalmente arrancado de um momento no tempo no qual estava perdido para deslumbrar todos os apaixonados pelo género.

Se pensarmos que Final Fantasy Tactics A2: Grimoire of the Rift foi lançado em 2008 e Tactics Ogre: Let Us Cling Together chegou em 2010, não temos um SRPG ou Tactical RPG da Square Enix há mais de 10. Triangle Strategy tem o empolgante mérito de não somente ressuscitar essas experiências nesta consagrada casa japonesa, como também se afirma como uma proposta que não pode cair no esquecimento. A equipa de Asano conseguiu um feito muito especial e entrega-te um jogo que vais guardar no coração com imenso carinho, enquanto esperas por mais novidades neste novo universo, sempre consciente que se isso não acontecer, pelo menos tens esta autêntica carta de amor a género, assinada com brilhantismo.

Triangle Strategy transporta-te para Norzelia, um mundo encantador, mesmo sem apostar tanto na fantasia quanto Ivalice, por exemplo. Em Norzelia, os reinos Glenbrook, Aesfrost e Hyzante coexistem numa paz frágil cujas fronteiras são constantemente ameaçadas pelos diferentes costumes que os separam. O ferro e sal são os bens mais preciosos neste mundo e após uma série de inesperados eventos, com muita trama política e social pelo meio (mesmo como estes jogos merecem e tão precisam), os três reinos entram num novo conflito. Não vou entrar em detalhes sobre o enredo, é mesmo de grande qualidade e com uma profundidade que te vai conquistar, mas se jogaste a demo já tens uma ideia do que se passa.

No papel de Serenoa Wolffort, o sucessor de uma das maiores casas nobres de Glenbrook, terás de navegar por este conflito de forma a assegurar a sobrevivência da tua casa nobre e sempre a lidar com situações que nunca são o que realmente parecem. Acompanhado por um crescente elenco de personagens, com especial destaque para Roland, o seu melhor amigo e um dos sucessores ao trono de Glenbrook, e Frederica, a sua noiva vinda do vizinho reino de Aesfrost, Serenoa terá de lutar contra diversos inimigos para sobreviver, graças às tuas decisões estratégicas, mas também terá de tomar importantes decisões que interferem com o desenrolar dos acontecimentos. Existem diversos momentos em que terás de tomar decisões importantes e se os teus principais conselheiros não concordarem contigo, terás de os tentar convencer.

Asano comentou que o seu desejo foi criar uma trama madura, mais adulta, algo que conseguiu em pleno e de forma muito satisfatória. Em Triangle Strategy nada é tão simples quanto aparenta, cada decisão tem consequências e ficarás agarrado a assistir a cada conversa sempre à procura de novos elementos que te informem melhor sobre o que está a passar. Dei por mim totalmente imerso neste mundo, sempre à espera do próximo acontecimento e quando dás por ti parado a tentar avaliar bem a decisão que vais tomar e qual a possível “rasteira” que vem a caminho, é porque o jogo está a fazer algo especial. Além disso, Triangle Strategy inclui segmentos onde podes passear pelas cidades e conversar com os cidadãos. São momentos quase de investigação pois podem permitir desbloquear informações que mais tarde serão preciosas em diálogos importantes. Existem causas e consequências para as quais não estamos preparados e a Square Enix conseguiu construir um mundo complexo com base em temáticas altamente oportunas para a realidade.

Com o aspeto de um jogo SNES feito nos dias de hoje, Triangle Strategy é a versão moderna e em alta definição de um daqueles JRPGs táticos que tantos jogadores apaixonaram na década de 90 e 2000. No entanto, ao invés de simplesmente copiar as suas mecânicas e regras, a Square Enix decidiu implementar algumas mecânicas novas que resultam num título cuja essência é clássica, mas com tom modernizado. Triangle Strategy é uma experiência incrivelmente polida e afinada para que não sintas atrito e até o grind é equilibrado para uma experiência difícil, mas não injusta, para que jamais sintas que o teu tempo é perdido apenas para prolongar um relógio.

Como seria de esperar, existem diversas classes de personagens aliados e adversários, com habilidades, capacidades de deslocação e ataque próprias, o que permite introduzir grande profundidade nos combates. Cada decisão tem uma consequência e Triangle Strategy até aposta numa maior coordenação entre companheiros para melhores resultados. Uma das mecânicas mais interessantes em jogos do género é que ao atacar um adversário pelo lado ou pelas costas tens maior probabilidade de acertar e até causar dano extra. Triangle Strategy vai mais longe e se tiveres um aliado num “quadrado” próximo, ele também aplica dano. Esta é uma das mecânicas que considero definir bem este jogo, é engenhosamente simples, mas poderá tornar-se letal. Se te deixares ficar rodeado, um simples ataque pode tornar-se em diversos turnos com ataques duplos e um personagem a morrer devido a um movimento mal calculado.

Este tipo de riscos e recompensas nas decisões trazem brilhantismo para os Tactical JRPGs, através de uma profundidade no gameplay que exercita a tua massa cinzenta e te faz sentir extremamente contente quando ultrapassas uma luta especialmente complicada. Desde o início terás personagens de diversas classes, com habilidades de ataque direto, longo alcance, suporte, cura ou magia. Terás de criar uma equipa equilibrada e usar as especificidades de cada personagem a teu favor. Podes usar um arqueiro para atacar a médio longo alcance, mas jamais se poderá afastar muito, poderás apostar num ataque feroz, mas arriscas deixar desprotegidos os personagens focados na cura. Isto são apenas exemplos básicos de uma estratégia profunda e desafiante, especialmente quando existem personagens especiais entre as forças adversárias.

Foi frequente repetir batalhas porque tomei decisões que prejudicaram logo no início o desenrolar dos combates, arriscando com uma personagem apenas para a deixar rodeada de inimigos. Os ataques especiais, que desbloqueias ao subir de nível, têm uma probabilidade de acertar e nem sempre as coisas correm como desejas. Felizmente, a Square Enix decidiu que a XP ganha durante as batalhas que falhas não é desperdiçada e podes tentar novamente a batalha de imediato e manter o nível que alcançaste durante a anterior. Isto provou ser muito valioso pois já perdi imensas horas noutros jogos devido ao nível que perdia quando perdia a batalha.

Dito isto, o único senão que senti ao desfrutar de Triangle Strategy está relacionado com a gestão dos personagens e a sua melhoria. A qualquer altura, mesmo no ecrã pré-batalha, podes aceder ao acampamento de Serenoa e gerir os teus personagens, falando com os diversos mercadores, ferreiro ou especialistas que se encontram na tenda. Uma vez que a Square Enix decidiu que a XP ganha está controlada, para não subires de nível ao ponto de banalizar a experiência, completar as batalhas opcionais na tende leva-te até certo ponto. A dada altura ganhas apenas 1XP por cada turno e precisas sempre de 100XP para subir de nível. Isto faz com que as “Mock Battles” tenham um propósito diferente, obter dinheiro ou materiais. O dinheiro e materiais servem para melhorar os atributos dos personagens e o grind foca-se nisto, obter materiais e dinheiro para desbloquear mais HP, força ou proteção para cada personagem.

Também podes subir a classe de cada personagem, mas isto exige uma moeda própria comprada com moeda ganha nos combates de história e torna-se em mais um elemento a gerir, o que poderá criar alguma confusão inicial e deixar-te sem saber exatamente o que fazer nas primeiras horas. Tantos elementos para gerir e tantos itens para ganhar se quiseres melhorar os personagens poderá criar alguma dificuldade na gestão. Foi o único elemento no qual senti que podia estar melhor, de forma a não causar algum atrito na experiência.

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