Blazing Chrome – Análise – Contra-corrente

Não é feito pela Konami mas parece.

O lançamento recente de Contra Anniversary Collection devolveu alguma esperança a todos aqueles que ansiavam por ver a Konami regressar a séries 2D de acção e disparos pelas quais se notabilizou ao longo de décadas. Mas a concretização cabal desse desejo aconteceu e dá pelo nome Blazing Chrome, um belíssimo “run’n gun” atestado de acção em esteróides e disparos ao bom estilo de Contra 3: The Alien Wars e Contra: The Hard Corps, jogos lançados no período maduro das consolas 16-bit.

Como aconteceu com Sonic Mania, também aqui estamos perante um estúdio independente que labora em pleno amor à camisola. São brasileiros os fundadores do estúdio Joy Masher, sedeado em Curitiba e criado em 2012 por Danilo Dias e Thais Weiller, eles que já nos deram Oniken e Odallus, dois jogos de idêntica inspiração retro. No entanto é inegável a repercussão maior que está a ter Blazing Chrome. Este jogo 2D de acção vai buscar à série Contra a sua maior inspiração, embora contenha elementos de Metal Slug e até de Cyber Lip, ambos da SNK. Os disparos constantes e a acção frenética, abundante em explosões e um disparo é suficiente para causar a morte do protagonista, são traços de um ADN que já não serve às produções modernas mas ainda vive na memória de legiões de jogadores.

3 Para além das quatro armas existem escudos, uma opção defensiva.

Blazing Chrome é por isso uma carta de amor aos saudosos jogos da Konami. Enquanto esta produtora não se decide em acrescentar um novo capítulo, a turma de intrépidos produtores brasileiros está disposta a segurar um lugar ao sol este verão. Por tudo o que o jogo representa, Blazing Chrome será um dos jogos de cariz retro mais falados de 2019, e com todo o mérito, diga-se. Não só por não existirem muitos jogos como este, mas porque a sua execução é muito competente, conjugando uma óptima arte pixel 2D com uma jogabilidade simples e eficaz. O grau de dificuldade é um pouco elevado, não vão vencer este jogo à primeira facilmente, mas Contra também o é, e sendo um jogo que pretende permanecer fiel ao modelo da produção da Konami, não podia ser diferente.

Um clássico tiro neles de composição retro

Ao tempo da produção de Contra, a Konami era uma presença habitual nos salões arcada. As suas “cabs” eram autênticos sorvedouros de ienes provenientes de jovens japoneses que gastavam o tempo livre depois da universidade, ou do liceu, nas tabelas de classificação. Os jogos de acção 2D em formato “scroll” horizontal ganharam popularidade ao longo da década de noventa. Novas e melhores placas gráficas elevaram a pixel art a níveis que deixavam qualquer jogo 8 bit como ultrapassado. Muitos desses jogos fizeram a transição para as consolas 16 bit. O trabalho que começara nas 8 bit seguia em popa nos sistemas Super Nintendo e Mega Drive. É esse “feeling” que encontramos em Blazing Chrome, um jogo de estética, arte e nível de produção mais próximo destas consolas Sega e Nintendo.

A narrativa de Blazing Chrome, não sendo relevante no sucesso do jogo, dá-nos a conhecer duas personagens: Mavra, uma mulher de longos cabelos louros e armadura pesada, e Doyle, a criatura cyborg e espadaúda, de estilo punk. Escolhemos um de dois antes de nos aventurarmos numa experiência marcada pela nostalgia e que pode ser ao mesmo tempo cooperativa. Depois de percorridas as cenas introdutórias, chegamos ao mapa, que nos permite escolher uma de quatro missões iniciais. Não, o jogo não é tão curto como podem estar a pensar. Há mais missões e cada uma é suficientemente longa para nos manter ocupados por longos períodos. Além disso, os níveis são bastante elásticos graças à inclusão de “sub-bosses” e adversários intermédios.

2 Veículos de combate.

Alguns surpreendem-nos mais do que uma vez, recorrendo a mais poderes e movimentos diabólicos no derradeiro confronto. Com o princípio “one hit kill” subjacente é bem provável que passem uma boa parte parte do tempo a repetir o mesmo nível até o cumprirem na perfeição, ainda que tenham uma mão cheia de vidas e os “saves” intermédios funcionem como uma ajuda suplementar. Das duas vidas iniciais passam a cinco em caso de “game over”, mas acreditem que se esgotam num ápice se não forem cirúrgicos a jogar.

Acção frenética que nem dá para pestanejar

De resto, os níveis apresentam uma deliciosa concepção. Avançando a passo ou em movimento automático quando sobem para um veículo retro-futurista, ou estão no topo de um comboio em rolamento. O ataque normal é o disparo automático, sem limite de munições. No entanto, é possível obter “power ups” e ganhar outros ataques. Um consiste numa espécie de chicote a laser, que tem na sua enorme amplitude uma grande vantagem. Outro é o fluxo de energia que é libertado depois de pressionado durante algum tempo o gatilho e ainda há uma espécie de granada.

A isso acresce um motor automático que nos acompanha durante algum tempo, disparando na mesma direcção para onde temos a nossa arma apontada, uma opção similar à do macaco em Metal Slug. Podemos mudar de arma a todo o instante, escolhendo a mais conveniente ao momento da acção, consoante as fraquezas e poderes dos bosses ou posicionamento dos adversários. No entanto, basta perder uma vida para o conjunto de armas obtidas se diluir num “restart”. É nestes momentos que mais se sentem os picos de dificuldade. As investidas dos inimigos são quase bárbaras. Multiplicam-se como formigas em movimento. Um golpe à curta distância é suficiente para anular um adversário, mas por vezes são efectuados disparos que por entre a confusão não são observados a tempo de um desvio, o que equivale a menos uma vida.

Completados cinco níveis é apresentada uma secção derradeira, uma espécie de teste a tudo o que aprenderam e ultrapassaram até então. Voltarão a encontrar os mesmos chefes de nível e novamente áreas repletas de inimigos. É uma fase bastante árdua e exigente, capaz de lembrar o último nível de Metal Slug 3, equivalente a uma batalha sem fim à vista. Blazing Chrome não evita momentos frustrantes. Muitas secções terão que ser repetidas vezes sem conta até seguirem em frente. Com tempo desenvolvem os processos adequados a dar a volta mesmo às situações mais delicadas, mas não são evitados momentos de maior frustração.

Pese embora o bom conjunto de níveis, parece-nos que em termos de experiência útil, isto é descontando os momentos que passam a repetir a mesma secção, Blazing Chrome não é muito longo. É aliás mais curto que qualquer Contra ou Metal Slug. No modo fácil completa-se em pouco tempo, o que acaba por condicionar um pouco as expectativas, mas esta é uma opção só para quem não esteja habituado ao género, dada a extrema facilidade. Recomenda-se que comecem a jogar em normal. No entanto possui um elevado valor de repetição e a verdade é que cada segundo desta acção é verdadeiramente explosivo e mal têm tempo para pausar ou pestanejar. Em alternativa podem aceder aos modos “Boss Rush” e “Mirror”, como bónus.

1Mavra acrescenta velocidade.

Igualmente bem-vinda a inclusão de um modo cooperativo. Ainda que de nível local, é reminescente das jogatanas arcade quando partilhávamos o jogo com um segundo jogador usando o mesmo ecrã. No final, sobra uma experiência memorável e altamente recomendada. Acção fluída e rápida, dotada de um bom tratamento visual e artístico, Blazing Chrome é sobretudo um jogo de inspiração retro muito bem executado. Não é feito pela equipa da Konami que fez os jogos da série Contra, mas parece. Esse é o melhor elogio que podemos fazer à JoyMasher por nos brindar com uma experiência memorável.

Prós: Contras:
  • Várias armas e poderes defensivos
  • Tratamento gráfico exemplar num jogo que presta tributo à série Contra
  • Arte pixel
  • Variedade de inimigos
  • Níveis longos com bosses intermédios
  • Sistema cooperativo
  • Sensação arcade
  • Não tem muitos níveis
  • Ocasionais momentos de frustração
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