The Dark Pictures Anthology: The Devil in Me – As delícias do terror e suspense

Eurogamer.pt - Recomendado crachá
Fórmula refinada pela produtora que entrega mais uma vez um trabalho bem delineado. Amantes de suspense e terror vão adorar.

No final de cada ano, já é habitual a chegada de mais um episódio de The Dark Pictures Anthology, sendo desta vez denominado por The Devil in Me. Esta é sempre a altura certa para este tipo de videojogos, com o inverno a bater à porta a trazer as suas noites gélidas e até chuvosas. Está criado o ambiente perfeito para se embarcar em mais uma viagem pelos corredores do medo. Não sendo propriamente aterradoras, estas apostas da Supermassive Games geram sempre enorme suspense e tensão, dando um ar de filme com desenvolvimentos muitas vezes previsíveis, mas que teimamos em continuar a gostar.

Neste novo capítulo, acompanhamos um grupo de cinco pessoas que trabalha no meio cinematográfico, mais propriamente num documentário sobre o maior assassino em série da história dos EUA. O realizador está desesperado por conseguir terminar o trabalho, pressionado por problemas financeiros empurra a sua equipa para uma tenebrosa viagem até a um local remoto a fim de alcançar os seus intentos. O grupo é constituído por elementos com um historial que vamos conhecendo com tempo, as suas essências são particularmente bem trabalhadas e têm um papel importante nas escolhas e caminhos a seguir.

Clássico com dilemas pessoais e suas inquietações

É na forte enfase de construção de personagens que The Devil in Me me surpreendeu pela positiva. Apesar de algumas limitações nas expressões faciais, estas são suficientes e convincentes para transmitir de forma visual e auditiva o que cada uma sente em cada momento. As bases são mesmo as relações entre o grupo, que são exploradas na construção dos desenvolvimentos narrativos e jogáveis. Existem dilemas pessoais, personalidades e inquietações a explorar, que vamos moldando com as nossas escolhas e respetiva exploração. Apesar de uma grande componente cinemática, o jogo vive muito de momentos pré-concebidos com cutscenes interessantes, também é-nos dada liberdade de movimentação pelo cenário, obviamente limitada para que sejamos conduzidos por trilhos pré-concebidos, mas cada trilho é uma consequência das nossas escolhas e conquistas.

Não é fácil cativar o jogador com demasiadas cenas pré-concebidas, há quem não tenha paciência, mas esta é mesmo a essência de The Dark Pictures Anthology, quem aqui vem sabe o que esperar e não irá reclamar que assim o seja. O novo público, deve dar-lhe uma oportunidade e mergulhar nesta forma narrativa, que obviamente não é única na indústria, mas que tem sido construída e evoluída por parte da Supermassive Games. Certo que somos levados como se de um filme se tratasse, mas são agora introduzidas bem mais partes jogáveis, com já referi. Estas são bem-vindas e estendem a nossa mão intrusiva, moldadora dos acontecimentos.

As nossas decisões são fulcrais

Como é de esperar numa narrativa tão clássica, um grupo de pessoas a dirigir-se para um determinado local remoto sem saber bem o que esperar, o oculto está em cada esquina e à medida que se avança descobre-se que as coisas não são bem o que aparentam. A nossa missão aqui é tentar que o grupo sobrevida até ao fim, tentar ao máximo que as nossas escolhas sejam acertadas, para que dessa forma os caminhos traçados sejam os da salvação e não uma morte dolorosa e horrenda. Para conseguirmos atingir esse objetivo, temos de analisar os acontecimentos e o que a história nos dá. Sempre com cautela e ver sempre cada texto e cada pista adquirida. Pensar o que poderá ser e se a escolha estará ligada a um fim fatal.

“tentar que o grupo sobrevida até ao fim, tentar ao máximo que as nossas escolhas sejam acertadas”

É aqui que reside o núcleo de toda esta construção, que desde já enalteço. Os produtores denotam que sabem o que estão a fazer, já que as pistas e conteúdos visualizados no cenário são de facto indicadores dos acontecimentos futuros. Certo que não vamos conseguir identificar sempre o caminho correto (três dos meus personagens morreram), mas é importantíssimo analisar tudo ao pormenor, com todos os personagens (continua a existir a troca entre personagens).

Para dar aquele extra em tensão, temos os QTEs, uns que podem ser fatais se os falharmos e outros que apenas irão modificar a linha narrativa. Estes QTEs estão espalhados ao longo de todo o jogo, não os considerei demasiado intrusivos e são uma forma de nos manter atentos e não desviar o olhar do que se está a passar, por vezes surgem quando menos esperamos.

Como referi em cima, temos uma maior liberdade de movimentos quando comparamos The Devil in Me com os anteriores da série, esta possibilidade jogável tem duas facetas, uma positiva e outra bem complicada de aceitar. A positiva já a referi, dá mais imersão à nossa presença, sentimos que estamos mesmo lá a moldar os acontecimentos. A menos positiva está relacionada diretamente com a forma rudimentar com que nos movemos pelo cenário e executamos determinadas ações, como ultrapassar obstáculos. Nos títulos anteriores já era assim, mas acho um tanto incompreensível a forma como andamos e corremos, mais aprecemos um robot que um humano. Também se denota algum atraso na execução dos movimentos, como se não houvesse correspondência imediata ao que executamos. Esta passagem para um jogo mais “jogável” barra numa jogabilidade defeituosa e débil.

Atmosfera sombria e cativante

Dando continuidade a questões técnicas, na PlayStation 5, onde joguei, existem dois modos visuais, um de desempenho a 60fps e outro com resolução superior a 30fps. Apesar de se conseguir aceitar os 30fps nas partes cinemáticas, quando passamos para o controlo do personagem esse modo de jogo torna-se, a meu ver, impraticável. Jogar a 60fps é a melhor experiência aqui, sem dúvida. Já visualmente, as cinemáticas são de alta qualidade, mas existe uma discrepância com os momentos gameplay e, de facto, não é um título que se destaque pelos seus visuais arrebatadores. São suficientes e cumprem com o propósito, mas é conseguida uma atmosfera tenebrosa e aterradora, com momentos de alguma ansiedade e até sustos repentinos. A nível sonoro está impecável, consegue mergulhar o jogador em toda a sua essência, não deixa escapar nada, desde as músicas até a sons subtis que tornam cada cenário mais sombrio e intenso.

“inquietação de espírito é a chama de toda esta narrativa, numa aposta adulta”

The Devil in Me é mais um capítulo recheado de mistérios e intensidade narrativa, com uma formatação que dá continuidade ao bom trabalho da Supermassive Games. Consegui manter-me agarrado de início ao fim, sempre em sobressalto, mas ao mesmo tempo a querer saber o que viria a seguir. A inquietação de espírito é a chama de toda esta narrativa, numa aposta adulta apenas direcionada aos amantes de suspense e terror, que gostam de sentir emoções fortes que nos fazem sentir vivos. São quase 10 horas que podem ser repetidas após o primeiro final, na tentativa de salvar todos os personagens e atingir o final ideal, se é que gostam desse tipo de epílogos.

Prós: Contras:
  • Narrativa clássica mas capaz de nos agarrar até ao fim
  • Personagens credíveis, com emoções palpáveis ao jogador
  • Excelente ambiente sombrio acompanhado por uma sonoridade de elevado nível
  • Dá vontade de repetir várias vezes
  • A componente da jogabilidade é débil e rudimentar
  • Alguma frustração quando fazemos a escolhas erradas
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