Onrush – Análise – arcade racer único e competitivo

As primeiras horas passadas a jogar Onrush, a nova propriedade intelectual da Codemasters, criada pelo pessoal que mudou de ares depois de extinto o Evolution Studios (anos a fio sob a alçada da Sony, com destaque para Motorstorm e o enorme DriveClub), são um tanto invulgares. Se estão à espera de jogar um tradicional “racing” na linha dos jogos supra mencionados, dentro de um sistema de partida e chegada, logrando voltas rápidas no intuito de chegar à meta à frente dos adversários, o melhor é colocarem de parte essa ideia.

A melhor definição de Onrush passa por enquadrá-lo na fórmula corridas com combates, na qual o caos e a agitação permanente entre os carros, motas e monster trucks cria uma espécie de caos, uma esmagadora batalha pela liderança. À medida que ultrapassava as primeiras horas, lembrei-me do peculiar trailer de Motorstorm de uma E3 um tanto já longínqua. Estávamos em 2005 quando a Sony anunciou esse jogo de corridas para a PS3. A luta na lama entre maquinaria tão diversa era de tal modo avassaladora que a concretização do jogo, mais adiante, pareceu deixar de fora algumas das ideias mais arrojadas deixadas em aberto no trailer.

É verdade que Onrush é fabricado por muita gente que trabalhou em Motorstorm e Driveclub, daí a conexão existente entre os seus jogos, estando bem presentes os pontos de contacto na natureza arcade, uma experiência acessível a qualquer jogador, mas Onrush é muito mais o ponto de chegada de uma ideia ousada e inicialmente formulada em Motorstorm. Onrush é muito mais um racer de batalha que um simples todo-o-terreno. Todo o jogo é uma prova de vitalidade, plena de influências e longe de se circunscrever a um género ou algo já experimentado naqueles exactos moldes.

1 Há uma ênfase no espectáculo, com bons efeitos visuais e uma modelação dos carros e cenários muito consistente.

Há uns largos anos, a Bizarre Creations procurou implementar as coordenadas de um Wipeout e Super Mario kart num mundo realista e repleto de carros equipados com super poderes. Foi igualmente uma prova de vitalidade, que no entanto não conseguiu singrar num mercado dotado de uma oferta tão vasta. Onrush parece resguardar-se melhor dos possíveis percalços, nunca afastando as influências, de Motorstorm a Driveclub, mas é também um progresso assinalável na forma como monta uma estrutura que não só é eficaz e tremendamente gratificante, ao mesmo tempo que arrepia caminho e parece rasgar novos horizontes.

Em Onrush está um exercício que parte de números previamente ensaiados na trilogia Motorstorm. O que começou por ser um arcade racer linear e empolgante, depressa galgou as fronteiras do admirável, penetrando em cenários paradisíacos, pistas mais amplas e abertas como que a uma rápida e conveniente exploração, ganhando tempo em atalhos e percursos alternativos. Onrush partilha essa coesão em ambientes e densidade dos espaços, repletos de pontos de elevação, rampas, obstáculos e uma série de elevações destinadas a aproximar aquele corpo em movimento – um caos aparentemente organizado – composto pelas viaturas de duas equipas agregadas por vários elementos, numa luta estonteante pelos pontos, pela destruição e pelas proezas de condução.

Esta estrutura, posta em funcionamento através de um poderoso motor gráfico capaz de gerar uma sensação de física impressionante como assinaláveis velocidades, depressa nos transporta para uma realidade distinta e sublime da competição automóvel, na qual os carros são a própria arma de arremesso, o “sujeito” da frase, o alvo a abater. Onrush gravita nesta identidade exclusiva, próxima de um palco útil para os fãs de experiências “first person shooter”, mas recreando as emoções de um arcade racer, sem quebra de adrenalina e sem uma nota fora de uma banda sonora psicadélica, dotada de uma tremenda energia.

2 O efeito de destruição é assinalável, mas depois de um takedown terão de aguardar pelo respawn, prosseguindo mais adiante.

Mas é sobretudo a física, a condução e controlo dos veículos que começam por sobressair, em terrenos tão irregulares e recheados de objectos que fazem de cada centena de metros uma oportunidade para uma acção. O jogo está recheado desses momentos, de tomadas de decisão e escolhas no instante, lançando uma habilidade sobre um inimigo ou uma jogada de cooperação com algum colega de equipa. Existem oito tipos de veículos, agrupados em quatro grandes categorias, mas o importante é reter as habilidades exclusivas de cada um, facilmente identificadas em três parâmetros, pelo que a escolha para um bom resultado da equipa não é um factor pouco importante.

Além disso, podem constantemente melhorar os atributos das máquinas, usando umas caixas que permitem optimizar certos parâmetros, tornando os carros mais potentes e dotados de maior versatilidade. No final, tudo depende do tipo de prova que estejam a disputar, tendo em conta que a nota dominante da jogabilidade é o trabalho de equipa. Em vez das habituais voltas rápidas e da luta pela posição na tabela de classificação, vão competir numa grande variedade de modos que atribuem consistência à gestão do mapa e dos cenários onde decorrem os confrontos, assim como aos ataques ofensivos e trabalho de equipa.

Os “jogos” ou desafios são constituídos por duas equipas em confronto, os azuis e os laranjas. O objectivo é o mesmo para ambas as equipas, lançarem-se numa luta pelos pontos esmagando os oponentes pelo caminho, através de uma série de “takedowns” bastante realistas – a boa física torna os contactos consistentes -, conjugados com o que se pode definir como provas de perícia (atravessando focos luminosos) e adicionando pequenas porções de tempo até vencerem o adversário. O curioso desta estrutura é que torna um divertido jogo de corridas num jogo de combate, ou mais do que isso até, num permanente esforço de equipa.

3 A física surpreende em qualquer um dos veículos. As motas são ágeis e velozes embora uma presa fácil para os carros mais musculados.

A campanha é longa, composta por dezenas de provas. Nelas são amparados por colegas controlados pela inteligência artificial, mas podem participar em corridas com adversários espalhados por todo o mundo ou com os vossos amigos, o que torna o factor divertimento ainda mais saliente. A sensação de enviarmos os carros para combate, agrega algumas premissas de um Destruction Derby, mas o certo é que Onrush é muito diferente e vincado pelos momentos peculiares de tudo o que vimos no âmbito dos jogos de automóveis com acção.

Contudo, e como referido acima, a primeira fase do jogo requer alguma preparação, já que são constantes as baterias de informação, seja pelas provas, veículos e habilidades. Há sempre explicações – que podem desligar e aprender mais tarde – e técnicas de condução essenciais. Por exemplo, o uso do travão de mão é muito mais importante do que parece a uma primeira vista. Para adornar melhor o carro em curvas apertadas, fugir a um adversário ou produzir um “takedown”, a sua múltipla utilização dá-nos um bom vislumbre do alcance deste jogo.

Há momentos no jogo em que se instala a dúvida, já que não é importante andar na frente, mas sobreviver e causar o máximo de dano nos rivais. Claro que a caravana avança e quanto mais rápido for o nosso andamento mais chances para obter pontos e obter superioridade sobre os rivais. Descobrir os melhores veículos para as provas é um ponto que nos leva a um constante jogo da tentativa e erro até encontrarmos a melhor combinação. No entanto, ao fim de uma dezena de horas estamos mais acostumados e já em plena posse da gestão e funcionamento das corridas, sendo esse o momento ideal para arriscar um pouco mais em termos de desafio, participando em provas mais exigentes.

4 Existem 14 cenários, amplos e dotados de imensos percursos a explorar.

Existem imensas coisas a fazer e pensar durante uma prova. Não chega a condução. Isso é só um veículo para algo maior, como a gestão da energia através da obtenção de esferas que melhoram a velocidade do carro, até ao uso das habilidades, que tanto podem servir os nossos “asas” como alvejar os rivais, atrasando-os em torno do objectivo, ou simplesmente melhorando a nossa prestação. Quem tenha visto já uma competição de Rocket League não deixará de pensar na forma laboriosa como os membros do grupo actuam quando a nossa prestação não é tão boa. É vê-los unirem esforços na produção um avançado trabalho de equipa.

Nos modos de jogo presentes, nunca é importante terminar em primeiro. Fundamental é obter mais pontos, como acontece em Overdrive, ainda que o modo Countdown tenha alguma aproximação através da premissa do grupo em eliminar os rivais, fechando os “portões”. A opção Switch é interessante por dar origem a uma sucessão de veículos utilizados. Ao eliminarem os rivais sobem para uma máquina melhor e mais potente. Por fim, o Lockdown, que tem como objectivo capturar e segurar uma área.

Depois da campanha, a estrutura multiplayer funciona como o palco adicional de ulteriores combates, no fundo a base para a qual o jogo se encontra desenhado. Uma experiência tão surpreendente e arrojada, transformar um arcade racer num competitivo jogo de combate, alicerçado num trabalho de equipa. Não é um jogo sem máculas, até porque ao fim de algum tempo a estrutura da campanha entra numa base circular e apenas as múltiplas habilidades dos veículos garantem alguma diversidade. No entanto e mesmo nalgumas inconsistências é uma proposta alicerçada numa vertente competitiva. Se a Evolution Studios pensou em fazer o Motorstorm do futuro, poucos pensariam ter de esperar 2018, e pela edição da Codemasters.

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